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Na banheira não há peixes...

2022

Todos conhecemos a história do louco que pescava numa banheira. Um médico, que tinha as suas ideias sobre tratamentos psiquiátricos, perguntou-lhe: ‘E se o peixe engolisse a isca?’, e ouviu o outro responder-lhe energicamente: ‘Que ideia, seu imbecil, não vê que é uma banheira?’ (Albert Camus, O mito de Sísifo, 2016 p.123)

 

 

Toma-se esta descrição situacionista pelo escritor francês como o ponto de partida para o projeto. Numa banheira, efetivamente, não é normal existirem peixes, como também não é normal a sua pesca num sítio tão absurdo como uma possível casa de banho por parte do seu residente.  Na banheira não há peixes…, pretende a partir da apropriação da narrativa apresentada por Camus e explorando o absurdo enquanto método, procurar especular sobre o evento narrado, potenciando-o e reformulando-o através da sua possível reconstrução, numa diluição entre a realidade e a ficção. Uma figura transportando uma banheira assente numa estrutura móvel, percorre os enormes passadiços á beira-mar situados na zona costeira de Espinho e seus arredores. Em cada saída para o mar desses percursos pedonais, ela procede a “puxar” um banco, sentar-se e com uma cana de pesca começa a pescar na banheira, de costas voltadas para o oceano, para o meio que lhe dá acesso ao que ela supostamente procura obter: o peixe (?) Apesar do própria ligação com a descrição de Camus , coloca-se também em evidencia o próprio território onde o ato performativo foi realizado, os passadiços situados na cidade de espinho, cidade esta piscatória e com forte relação com atividades marítimas, permitindo desta forma o contacto com a população local e potenciando o processo criativo. Espinho, torna-se no lugar ideal, um ponto de relação entre a narrativa performativa, os habitantes e a história local, onde a cada vez maior restrição à pesca, a arte xávega (ou de cerco e alar para terra) posta recentemente em causa ou o envelhecimento progressivamente mais acentuado e demarcado dos pescadores locais, revelam-se possíveis assuntos despoletados pela ação, de colocar questões sobre o quotidiano, os seus movimentos e iterações. De procurar o contacto entre a cidade e o performer, entre o habitante e o autor, em suma, entre pessoas que caminham no seu dia-a-dia e se cruzam. Transportar uma banheira com água, como ação geradora de encontros: esta é a potência atualizada no gesto de caminhar, que reencena a cidade como uma relação entre trajetórias anónimas e descoordenadas.

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Na banheira não há peixes..., - Frames do vídeo do ato performativo

(16:9, 50’08’’, cor, c/som, loop)

Passadiços de Espinho e S. Félix da Marinha, 5 de outubro de 2022
Duração: 3 horas e 48 minutos
Adereços: Banheira com estrutura móvel, cana de pesca e banco adulterado com alças

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